Por Pablo Ruiz*

Em junho deste ano, enquanto a Cúpula da Organização do Tratado do Atlântico Norte, da OTAN, estará sendo realizada em Madri, Espanha, organizações sociais e pacifistas realizarão, nos mesmos dias, a Cúpula pela Paz como forma de manifestar sua oposição à guerra, assim como também de rechazar o intervencionismo que tem sido a prática desta Aliança militar liderada pelos Estados Unidos.

No contexto de uma reunião preparatória, em janeiro passado, ativistas de diversas organizações emitiram suas opiniões e dados sobre o quão nefasta a Aliança Atlântica, a OTAN, tem sido para o mundo.

Jörg Kronauer, jornalista alemão, ressaltou que «a OTAN nunca foi uma força para nada de bom. Fala-se sobre democracia e direitos humanos. Como você pode dizer que eles defendem a democracia e os direitos humanos e enviam ajuda à Arábia Saudita? O jornalista lembra que «a OTAN foi estabelecida quando a Guerra Fria começou. Os países capitalistas estavam indo contra os do Leste e a OTAN queria, através da brutalidade e ameaças, suprimir esses países».

A OTAN foi fundada, em 1949, como uma aliança de 12 países e, atualmente, conta com 30 países membros. Muitos acreditavam que com a queda da União Soviética e o fim do Pacto de Varsóvia (fundado em 1955 e dissolvido em 1991) a OTAN também desapareceria, mas não foi assim, pois continua a expandir-se alimentada por narrativas e justificativas de supostas ameaças e criação de inimigos.

É sabido que, no início dos anos 90, a ex-URSS considerava o compromisso de que os EUA e a OTAN não avançariam em direção às suas fronteiras: «Nem um centímetro para o Leste» foi a promessa feita pelo Secretário de Estado estadunidense, James Baker, mas a palavra prometida não foi cumprida.

Jörg Kronauer lembra que «nas décadas da Guerra Fria, a OTAN era simplesmente, e todo o mundo sabia, uma organização anticomunista». No entanto, sublinha: «se a OTAN fosse simplesmente anticomunista, teria se dissolvido após o colapso das forças comunistas nos anos 90; mas a OTAN continua sendo utilizada pelos países ocidentais para fazer o trabalho sujo, para matar, para lançar bombas».

Fiona Edwards, da plataforma “No Cold War”, aponta que «os EUA e a OTAN deixaram um rastro de destruição». A situação atual no Afeganistão, após vinte anos de guerra liderada pelos EUA, é uma grande prova. Há centenas de milhares de pessoas que morreram nesta guerra, assassinadas pelas forças dos EUA, e aí está o que deixaram lá, nestes 20 anos de guerra: pobreza extrema, é um desastre humanitário».

A Aliança Aukus

Por outro lado, a ativista denuncia que «o pacto militar entre os EUA, a Grã-Bretanha e a Austrália contra a China estão ameaçando a estabilidade. Estamos falando de uma nova Guerra Fria e é importante entender que a principal prioridade dos EUA e da política estadunidense é acabar com o governo chinês».

«Se olharmos para os mapas e os mapas de bases militares ao redor da China, podemos compará-los com as bases que a China tem no resto do mundo, e a China tem zero bases militares no resto do mundo e a China está rodeada de bases militares que a cercam. A China tem zero recursos militares ao redor dos EUA e Europa. Estamos falando de zero contra centenas de bases militares», diz Fiona Edwards.

A Aliança estratégica denominada Aukus (do acrônimo em inglês de Austrália, Reino Unido e Estados Unidos) vem sendo destacada na imprensa com tendo o objetivo de «defender os interesses compartilhados no Indo-Pacífico» desses governos. A Aliança Aukus permitirá que a Marinha Real Australiana possa adquirir submarinos com propulsão nuclear.

«O que há é uma guerra dos EUA contra a China, e a China deixou claro que não quer uma guerra fria. Eles não querem uma guerra, nem fria nem quente, e muito menos querem uma guerra nuclear, o que é uma grande ameaça para toda a humanidade», sublinha Fiona Edwards, acrescentando que «a China está pedindo paz; e o que precisamos agora, é que todos os recursos da humanidade sejam dedicados a se desdobrar contra ameaças reais, não ameaças imaginárias. A grande ameaça é a pandemia, a mudança climática é uma grande ameaça. A pobreza é outra ameaça real. E esta guerra fria vai contra os interesses de toda a humanidade.»

A OTAN é responsável pelos gastos militares

Ludo De Brabander, um ativista pela paz, belga, de Vrede, acrescenta que «a OTAN é responsável pelos gastos militares». Lembra que quando os EUA e a OTAN lançaram sua campanha na Bósnia, Afeganistão, Iraque e Líbia, o orçamento armamentístico disparou. «As vendas combinadas de armas das 100 empresas de serviços militares e maiores produtoras de armas do mundo (SIPRI Top 100) foram de 531 bilhões em 2020, em comparação com os 300 bilhões em 2001».

«A OTAN representa hoje mais da metade dos gastos militares mundiais, e essa proporção certamente aumentará nos próximos anos. Os gastos militares da Rússia são aproximadamente 6% do que a OTAN gasta, apenas um pouco maior do que o da Alemanha ou do Reino Unido, então as políticas de confrontação em torno da Ucrânia estão fazendo com que o orçamento militar da OTAN aumente ainda mais», observa.

O ativista recorda que «o golpe de Estado em Kiev e a anexação da Crimeia por parte da Rússia foram utilizados pela OTAN para concordar na Cúpula do País de Gales (2014) que os Estados membros da OTAN deveriam gastar 2% do PIB em seu aparato militar. Um total de 20% das suas despesas militares devem, daí em diante, ser destinadas à compra de material bélico. Desde então, o orçamento militar da OTAN passou de 896 bilhões de dólares para 1.049 bilhões de dólares, em meados do ano passado, um aumento de 15%», e que «a indústria de guerra da OTAN também domina o mercado mundial. Segundo o CIPRI, os três Estados membros da OTAN, Alemanha, França e EUA aumentaram sua cota no mercado de armas para mais de 50%.»

«Nos últimos anos, a OTAN aumentou a tensão com a Rússia e a China, a quem chamou de ‘rivais sistêmicos’ e é assim como a indústria da guerra pode ter enormes benefícios em detrimento da segurança e da paz real, e de uma segurança humana e confiável», diz o ativista belga.

É relevante acrescentar que não há apenas maiores gastos e militarização dos países membros da OTAN, mas também verdadeiros atos de provocação contra países que são declarados como inimigos. Nos últimos anos, aviões e navios de guerra da OTAN, incluindo submarinos com capacidade nuclear, realizaram manobras militares perto das fronteiras da China, Rússia, Coreia do Norte e Irã; e tentaram, inclusive, penetrar as fronteiras desses países.

 

Armas nucleares

Ludo De Brabander, ressalta que «as crescentes tensões internacionais também estão impulsionando novos investimentos em arsenais de armas nucleares. De acordo com o ICAN, as potências nucleares investiram US$ 72,9 bilhões na manutenção e melhoria de suas armas nucleares. Metade disso corresponde aos EUA e, com a França e o Reino Unido incluídos, 67% dos investimentos em armas nucleares são em nome dos países da OTAN».

Para a britânica Kate Hudson, da Campanha para o Desarmamento Nuclear, «a OTAN é uma aliança com Estados com armas nucleares. Estima-se que os EUA, a França e o Reino Unido têm cerca de 6.000 armas nucleares, em seus arsenais nucleares».

«A OTAN tem continuamente reiterado seu compromisso de ser uma aliança nuclear. Principalmente, após a cúpula de chefes de Estado em Bruxelas, no ano passado. Além desses arsenais nucleares, existem aproximadamente 150 bombas de gravidade termonuclear na Europa. Basicamente, são armas nucleares que são liberadas a partir de aviões. Estão localizados em 5 países: Bélgica, Alemanha, Países Baixos, Itália e Turquia. E, recentemente, os EUA anunciaram que essas armas, sob seu guarda-chuva nuclear, serão atualizadas para que possam ser melhor utilizadas», sublinha Hudson.

No entanto, há forte oposição à existência de armas nucleares por parte dos movimentos sociais europeus e também por parte dos governos dos Estados que as albergam.

«É uma questão que voltou a ser colocada recentemente sob o novo governo alemão com alguns membros desse governo que se comprometeram com uma Alemanha livre de armas nucleares. Essas armas poderiam ser transferidas para a Polônia, o que resultou em uma resposta imediata de Lukashenko, que ofereceu à Rússia a possibilidade de introduzir armas nucleares na Bielorrússia, o que potencialmente poderia ser uma escalada», observa Kate Hudson, acrescentando que «a Rússia fez uma proposta para que todas as armas nucleares estejam no Estado detentor dessas armas, isso exigiria a eliminação das bombas B 61 dos EUA dos Estados membros da União Europeia, e essa é uma reivindicação, de há muito tempo, do Movimento pela Paz».

A ativista lembra, do Tratado de Não Proliferação, que «os artigos 1º e 2º proíbem a transferência de armas nucleares para Estados que não são uma potência nuclear. Mas as armas nucleares dos EUA estão sim localizadas em países sem uma força nuclear, sendo assim sua presença ali é ilegal».

 

Crise Climática

Para Enrique Quintanilla, espanhol e membro da Ecologistas em Ação, «na crise climática há uma enorme responsabilidade da OTAN, não há dúvida; e se somamos a do resto dos exércitos, do resto dos países, o resultado atinge dimensões terríveis».

«Venho revisando incidentes e incidências do uso militar e sua influência sobre o clima, e na Espanha, só dou dois exemplos: o campo de tiro no Parque Natural Bardenas Reales é o maior da Europa Ocidental, e as bombas nucleares que caíram sobre Palomares, em 1966, ainda têm efeitos nos arredores».

O ativista recomenda a leitura do relatório do CentreDelas intitulado  “Crisis climática, Fuerzas Armadas: Impacto Medioambiental” («Crise Climática, Forças Armadas: Impacto Ambiental»); os relatórios do TNI intitulados  “Los peligros de militarizar la crisis climática” («Os perigos de militarizar a crise climática») e “Cambio climático SA” («Mudanças Climáticas SA»). Neste último relatório, «os autores documentam meticulosamente como os exércitos e as corporações, com o consenso de certos grupos políticos, buscam tornar as mudanças climáticas um grande negócio lucrativo, ao mesmo tempo em que aprofundam a exclusão das e dos despossuídos, expostos às piores consequências».

Enrique Quintanilla, da Ecologistas em Ação, denuncia a máquina de guerra da OTAN e ressalta que «o militarismo é uma das causas relevantes do aquecimento global e dos danos ambientais observados ao redor do planeta», por isso «temos que exigir que sejam suspensos todos os tipos de dispersão de tropas, todo tipo de manobras, de exercícios, de desfiles, de atividades dos exércitos que só objetivam mostrar seu poder e gastar dinheiro para que as empresas armamenteiras continuem obtendo muitíssimos benefícios».

*Pablo Ruiz, é membro do Observatório para o Fechamento da Escola das Américas (SOAWatch).

 

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